Hoje faz cinco anos que a sua voz se calou para sempre. Dia 23 de julho de 2011, Amy Winehouse foi encontrada morta em sua casa, encerrando abruptamente uma carreira brilhante e deixando milhões de fãs desconsolados mundo afora.
Ninguém se conformou, é claro, mas aquela situação não era totalmente inesperada. A difícil relação de Amy com o álcool e as drogas era conhecida do público, ainda mais porque, nos últimos anos, vinha prejudicando o seu desempenho nos palcos – ela desafinava, esquecia as letras, perdia o ritmo. E todos já sabiam o quão difícil era convencê-la a se tratar. Os versos do seu sucesso Rehab deixavam isso bem claro: “Tentaram me levar para a reabilitação/eu disse não, não, não”.
Amy tinha decolado feito um foguete. Aos 14 anos ela acompanhava o irmão na guitarra e mostrava um talento explícito para a música. Um pouco mais tarde, começou a se apresentar em clubes e pubs e gravar fitas demo, atraindo a atenção de empresários.
Quando saiu seu primeiro álbum, Frank, em 2003, os críticos e o público não tiveram dúvida de que nascia uma estrela. Todos ficaram impressionados com o estilo marcante que misturava tendências clássicas das divas americanas do jazz e uma pegada contemporânea de hip-hop. Outro aspecto admirável era seu talento de compositora: ela havia escrito todas as músicas do disco.
Com Frank, Amy começou a colecionar prêmios, inclusive o de melhor álbum do ano (Mercury Music Prize). Em 2006, com o álbum Back to Black, firmou-se como umas das cantoras mais importantes da sua geração. Nessa época havia consolidado o visual, com penteado retrô, maquiagem marcante e vestidos curtos e sensuais. A aparência retratava seu estilo musical, uma mistura do antigo e do novo.
Cada vez mais, o mundo se curvava a ela. Graças a Back to Black, Amy foi a primeira britânica a ganhar cinco Grammy numa única noite. Mas a consagração também tornou público o seu problema com o vício de drogas.
Além de atrapalhar as apresentações, o comportamento autodestrutivo interferia em sua capacidade criativa. Quando ela entregou o repertório para o terceiro disco, os executivos da gravadora simplesmente rejeitaram as músicas. Ainda assim, ela prometia um novo álbum para 2011, o que não aconteceu. O resto é história.
Em janeiro de 2013, um ano e meio depois da morte de Amy, foi levado a público o laudo médico produzido a partir do inquérito aberto para apurar o caso. Amy tinha no corpo 416 miligramas de álcool para cada decilitro de sangue – para se ter uma ideia, é uma quantidade cinco vezes além do limite permitido pela legislação britânica para uma pessoa dirigir. Ao lado do corpo, tinham sido encontradas duas garrafas vazias de vodca.
O desaparecimento repentino da cantora trouxe mais um aspecto sombrio à sua biografia, ao incluí-la no “Clube dos 27 anos” – relação de artistas célebres que morreram com essa idade, como Jimi Hendrix, Brian Jones, Kurt Cobain, Janis Joplin e outros.
Todo ano a data é lembrada com um toque de nostalgia, mas, no fundo, por mais trágica que tenha sido a morte de Amy Winehouse, o que os fãs realmente lamentam é a interrupção prematura da sua carreira. Eis o ponto.
O lado cínico da história é que encerrar uma carreira promissora de modo repentino não é exclusividade de quem morre: não apenas o meio artístico, mas também os esportes, as ciências e diversas outras profissões têm listas de personalidades que, por força de decisões erradas, mudanças de rumo ou circunstâncias infelizes, deixaram de brilhar – sobrevivem, mas perdem parte importante da vida. Certos exemplos são significativos: o ator norte-americano Mickey Rourke; a atriz Greta Garbo; os jogadores brasileiros Tostão, Pedrinho e Zé Sérgio. Fora aqueles que nem tiveram incentivo para começar e ficaram com a genialidade adormecida para sempre.
Alguns conseguem fazer uma bela limonada com o limão que a vida lhes deu, como é o caso de Tostão: afastado dos campos de futebol por causa de um problema no olho, o atleta que encantou o mundo na copa de 1970 se formou em medicina (a propósito, especializou-se em oftalmologia) e, mais tarde, tornou-se um prestigiado comentarista esportivo.
A maioria, no entanto, acaba se perdendo no vazio, vendo evaporar uma carreira que poderia ter sido exitosa e deixando saudades. Saudades do que nunca foi.
Da Inglaterra de Amy Winehouse vem a impressionante história do Stone Roses, grupo que, depois de explodir na cena musical no final da década de 1980, perdeu o rumo e nunca mais o encontrou.
A banda tinha quase dez anos de estrada quando lançou o primeiro álbum, The Stone Roses, em 1989. Recebido sem estardalhaço, o disco começou a ganhar a atenção do público e da crítica até que levou o grupo ao estrelato. As músicas faziam uma dosagem perfeita do som melodioso criado nos anos 1960 e 1970 e incorporavam a influência da dance music eletrônica que os também britânicos do New Order vinham explorando com êxito.
Com essa receita, o Stone Roses renovou a então esmorecida cena musical inglesa, fazendo em seu país o mesmo que o Pixies fazia nos Estados Unidos. Anos mais tarde, o cantor Ian McCulloch, líder do Echo and The Bunnymen, banda símbolo da década de 1980 (seu baterista, Pete de Freitas, também se tornou membro do indesejado Clube dos 27 anos após um acidente de moto), admitiu numa entrevista que a ascensão dos rapazes influenciara na decisão de não continuar mais com o seu grupo: “Eu não podia suportar os Roses melhores que nós”.
O sucesso da banda atraiu a cobiça dos empresários. Em meados de 1990, a gigante Geffen Records acenou com uma proposta milionária. Insatisfeito com os valores que a Silverstone, sua gravadora, vinha pagando, o grupo rompeu um contrato de cinco anos e aceitou o adiantamento de um milhão de libras feito pela Geffen para o seu próximo disco.
A Silverstone não admitiu o rompimento e, em setembro, acionou judicialmente a banda. Em maio de 1991, o tribunal negou as pretensões da gravadora e o Stone Roses ficou livre para trabalhar com a Geffen. Mas a Silverstone apelou, arrastando a questão por mais de um ano.
Nesse período, a chama do Stone Roses começou a apagar. Seus integrantes se separaram e viajaram sozinhos pela Europa em busca de inspiração para projetos particulares. Numa sucessão sinistra de acontecimentos, pessoas influentes ligadas à banda faleceram. Outras, cansadas de esperar, abandonaram o barco.
No final de 1993, o grupo entrou em estúdio para a gravação do segundo disco, mas levou quase um ano para finalizá-lo – 347 dias, precisamente. Em dezembro de 1994, finalmente chegava às lojas Second Coming (“Segunda Vinda”, modéstia à parte), cujas músicas, com som pesado de blues e rock, frustraram os fãs.
O ambiente era outro. O grunge, com o Nirvana à frente, exigia muito de quem quisesse seguir a mesma trilha. Já o caminho aberto pelo Stone Roses cinco anos antes tinha sido percorrido por grupos como Oasis, que acabaram se firmando e assumindo lugar de destaque. Os mestres, agora, deveriam disputar lugar com os discípulos.
A recepção ruim de Second Coming acabou com o que ainda havia de ânimo entre os membros do grupo, que resolveram seguir caminhos próprios.
Em 2011 – ironicamente, o ano da morte de Amy Winehouse – os Stone Roses ensaiaram uma volta que se consumou, mas apenas para apresentações. Somente neste ano é que anunciaram o tão aguardado terceiro álbum da banda. Os fãs se empolgaram, com alguma cautela.
Todos torcem para que o disco os faça recuperar pelo menos parte da força que tinham no início. Se isso se concretizar, a música só tem a agradecer.